quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Te Doy Mis Ojos

Hoje voltei, mais uma vez, a sentir o grande prazer de partilhar a visão e o debate a propósito de um filme passado no Clube de Cinema da nossa Escola.

E permanece em mim uma das cenas mais belas deste filme.



“O pintor diz que podemos escutar os quadros.
Escutá-los aqui dentro, como se fosse música.
Pois as cores são como as notas e repetem-se como numa melodia.
Três amarelos, dois azuis e depois outra vez amarelo…
E o silêncio: o branco.
O branco não faz barulho, não faz doer.
Se conseguirmos ouvi-los, também conseguimos senti-los.
O verde é o equilíbrio.
O azul profundidade e o violeta…
…o violeta é o medo.”

A música é dum autor que também trabalha
com Pedro Almodovar: Alberto Iglésias.
A actriz: Laia Marull.
A realizadora é uma mulher: Iciar Bollaín.

O filme: “Dou-te os Meus Olhos”.

E foi uma das mais belas experiências cinematográficas que tenho tido ultimamente.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

BELEVILLE RENDEZ-VOUS

Há filmes que começam por nos passar ao lado.
Não porque amigos não tenham chamado a nossa atenção, Vai ver, vai ver, é bestial.
Não porque não nos cruzemos com eles, na fnac, encontrando-os aí, mais tarde, a um preço bastante razoável.
Será por outra razão qualquer: vagamente, sei cá, por sentirmos que não chamam por nós, ou pensamos que, para já, temos outros filmes à espera na fila...

Belleville Rendez-vous (no original, Les Triplettes de Belleville, isto é, as trigémeas de Belleville, que são três encantadoras velhinhas de music hall) é, obviamente, um desses casos.
Se, na última sessão - com tantas ausências - não houvesse uma colega a emprestar-mo;
se, mesmo assim, hoje, a minha filha não pedisse para ver um filme novo;
se não,
se não,
se não e se não...,
esta pequena obra-prima de Sylvain Chomet nunca teria tido «rendez-vous» comigo. E, claro, quem ficava a perder era eu.

Os desenhos são magníficos. Mais clássicos do que experimentais, fazem-me até lembrar uma certa fase da Disney: é fácil captarmos semelhanças entre estas figuras e as personagens dos 101 Dálmatas. Por outro lado, é adivinhável a secreta inspiração de Tex Avery: repare-se somente naquele espectáculo dos anos 20, em que os sapatos de um ás do sapateado se libertam dele, transformando-se numa espécie de monstros que o devoram...

Mas, sobretudo, existe, na história simples de um rapto improvável e delicioso, um humor em que se misturam o realismo e o irrealismo mais caótico, que aprecio particularmente. (Um crítico do Blitz associava-o, e bem, ao dos Monty Python). Os apontamentos realistas, aliás, não fazem cedências ao «politicamente correcto»: vejam-se os traços que definem o carácter português da senhora «Souza», o seu ligeiro buço ou a sola ortopédica com que «completa» a perna mais curta; vejam-se os retratos da velhice, mais sarcásticos do que meigos; e, por todo o lado, os dentes excessivos, as mulheres enormes e os maridos demasiado franzinos...

O filme está impregnado de uma ternura que nunca se manifesta em gestos ou afagos. Ou, sequer, em palavras. Chegamos a pensar que aquele cão não é amado; que mesmo a relação entre a mãe e o filho ciclista tem algo de duro. E, no entanto, é nos actos que se revela a dedicação que pode ir a extremos maravilhosamente absurdos.

Não posso prometer a mim próprio que não voltarei a não me interessar por filmes que valeriam a pena. Pior para mim. Mas sei que, apesar dessas desmotivações injustas, se darão, por vezes e por coincidência, outros rendez-vous especiais. É bom sabê-lo...

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

APONTAMENTOS

João Camacho. Tenho nas mãos a 2ª edição, revista e aumentada, do livro 30 e tal olhares. Traz o teu texto sobre 2001: Uma Odisseia no Espaço. Guardei-te um exemplar. Vens reclamá-lo? Ou envias-me um endereço? Espero um sinal.

E já que comecei a escrever, aproveito para recomendar o último Woody Allen: um regresso ao seu cenário de tantos filmes, a terrível Nova Iorque, e, simultaneamente, um retorno ao seu humor mais corrosivo. Com um protagonista (que não é representada pelo próprio Allen, mas por um seu alter ego, Larry David) de um cinismo tremendo, que não crê na esperança - mas, pelo menos, como se verá, crê nas
coincidências, e em que algumas coincidências «podem dar certo»! Há muita luz vencendo «o horror! o horror!»? Não há. Mas sobra um feixe mínimo de luz a que nos apeguemos...

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

CINEMA E CINEMAS

Dia: Sábado. Cinema: King. Filme: Un Prophète, de Jacques Audiard.
Dia: Domingo. Cinema: Lusomundo Cascaishopping. Filme: Invictus, de Clint Eastwood.
Un Prophète. Chamaram-lhe o Padrinho do século XXI. Exagerado? Sim. O filme não correspondeu às expectativas. Mas se foi melhor do que ir ver o Did you hear about the Morgans? Sim, foi. Se foi melhor que ir ver o Avatar? Sim, foi. Se foi melhor que ir ver o Sherlock Holmes? Foi.
Invictus. Uma desilusão pegada. Não fosse a assinatura dum dos grandes gigantes sobreviventes do cinema americano, seria apenas mais um filme desinteressante (entre tantos que estreiam entre nós). Morgan Freeman genial, indubitavelmente. O resto, previsível. Será verdade que este filme é do mesmo tipo que realizou o Gran Torino??? Parece que sim.
Mas sejam quais forem as diferenças entre os dois filmes em termos qualitativos, vamos ao que interessa. Que é falar sobre dois cinemas distintos, dois públicos distintos, duas experiências distintas.

King. Cinema mais alternativo. Os filmes premiados em Cannes, Veneza ou Berlim, é ali que os encontramos (ou no El Corte Inglês, faça-se justiça). A sala, num sábado à tarde, contava com a avassaladora presença de 6 pessoas.
Lusomundo Cascaishopping. Cinema para todos: delinquentes juvenis, bebés chorões, idosos lamechas, chanfrados de toda a variedade, labregos e até pessoas que questionamos terem ou não posses económicas suficientes para aquele bilhete de cinema (perdoem a afirmação tipicamente social-democrata... mas há que ser sincero).
King. 150 minutos de sossego a ver um filme que é, no mínimo, diferente.
Lusomundo. Uma experiência com que o 3D não se compara. Começou com as pessoas a chegarem atrasadas aos lugares. Fantástico! Adoro. Depois, vieram as pipocas. A primeira parte do filme, para além do som dos ossos a quebrarem-se nos jogos de rugby, era acompanhada pelo ruído de pipocas a serem mastigadas. Depois, ao meu lado, um sujeito que se levantava constantemente (ou regularmente) da cadeira, apenas para se voltar a sentar um segundo depois. À minha frente, tive a sorte do meu bilhete incluir uma narradora do filme (já que a minha inteligência é muito limitada para compreender filmes complexos como este). A simpática senhora fazia-me o favor de enfatizar as partes dramáticas da obra e por momentos senti-me como um ceguinho completamente à nora a quem a senhora fazia o obséquio de ajudar a atravessar a estrada. Obrigado, cara dama! Ah, e quase me esquecia da cena de pancadaria que quase se desenrolava porque dois rapazes com idade para terem juízo (e para puxarem as calças para cima) se tinham sentado nos lugares errados. Depois, o intervalo. Algo que eu adoro. E que é muito útil. Quem chegou atrasado e não teve tempo para as pipocas, pode ir comprá-las agora. Recomeça então o filme e há mais um rol interminável de sujeitos que chegam atrasados. O filme acaba. Aleluia, viva o senhor!
Foi uma sessão desagradável, que de certo modo me fez valorizar mais Um Profeta. Se o cinema é de facto uma experiência, porque é que são os próprios cinemas os primeiros a incentivar actos tão desagradáveis como estes (é uma pergunta retórica, eu sei porquê - é por causa do camarada LUCRO). Mais vale sempre ir a um cinema alternativo, pacato, ver algo diferente, variar um pouco. Talvez o exemplo do Invictus não tenha sido o melhor. Mas não nos esqueçamos que lá por ser do Sr. Eastwood não deixa der um produto ultra-comercial. Desta vez, apeteceu-me falar mais dos cinemas do que de cinema. Acontece. Para a próxima, prometo gastar um post inteirinho numa apologia a um filme qualquer (ou numa crítica feroz, como tão bem sei fazer...)