domingo, 24 de abril de 2011

25.ª Sessão do CC de 2010/2011

Quarta-feira no Anfiteatro
27 de Abril de 2011 às 14h00

A Ponte do Rio Kwai
de David Lean

apresentado pela
Prof.ª Teresa Gomes

Este filme costuma ser apresentado como um filme sobre a segunda guerra mundial, ou sobre um campo de prisioneiros japonês na Birmânia (hoje Myanmar) ou, como vem descrito na minha versão em DVD, a “história da destruição de uma ponte ferroviária construída pelos prisioneiros britânicos na Birmânia ocupada”(?!). Mas o que vem de imediato à lembrança é o tema musical do filme: a “marcha do Coronel Bogey” assobiada pelos prisioneiros britânicos.



O contexto temporal reporta-nos para 1943. O Japão, potência imperialista do Eixo, expandia o seu domínio na Ásia contra o domínio colonial britânico, firmado durante o século XIX nas guerras anglo-birmanesas que terminaram com a anexação de diversos territórios na Indochina. O avanço japonês punha em causa o domínio britânico e servia de apoio para o ataque à Índia. A construção de uma linha de caminho de ferro que ligasse o sul (Singapura) ao Norte da península da Indochina, servia a estratégia japonesa.

A companhia britânica comandada pelo coronel Nicholson (papel assumido pelo brilhante Alec Guinness) chega ao campo de prisioneiros comandado pelo general Saito (Sessue Haykawa), com o objectivo de ajudar a construir uma ponte ferroviária sobre o rio Kwai. As cenas iniciais apresentam os princípios em confronto. De um lado Nicholson, representante dos valores civilizacionais europeus a ser implementados em todo o mundo – “Sem lei não há civilização”. Para Saito (Sessue Haykawa), a missão tem de ser levada a cabo para manter a sua própria dignidade. Trata-se da sua contribuição pessoal para o sucesso do seu país. Assume-se como um elo na engrenagem imperial. A questão da liderança é o aspecto que mais me atrai neste filme. Dois estilos de liderança que correspondem a duas culturas diferentes.

“Líder não é aquele que manda mas o que é seguido”. Tal afirmação, a ser verdadeira, remete-nos já não para a unicidade do tema da liderança mas para um binómio - líder e liderados. Quem o segue e por que o segue? Esta é a questão mais interessante. Porque tem um cargo superior? Porque defendem os mesmos valores?
Neste tema emerge também um terceiro ponto fundamental – o contexto, a missão. O orgulho tecnológico do Ocidente. O Homo Faber que se realiza construindo, criando, mesmo que isso sirva os propósitos do inimigo. Como refere Nicholson, é preciso dar-lhes um propósito, um objectivo. O ardor colocado nesta missão sobreleva-se às leis que o próprio Nicholson coloca acima de tudo no início do filme – e acaba por desequilibrar o sistema de liderança: o líder, os liderados, a missão.

A personagem de Shears (Wiliam Holden), o americano, também é muito interessante. Representará a liberdade individualista do novo mundo? Servirá de contraponto ao ponto de vista do coronel Nicholson? O que o move? No fim percebe-se; a mensagem é simples e localizada no tempo. É um filme de 57. Fascinante.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Ainda a propósito da visualização, na última sessão, do filme “Capitães de Abril” de Maria de Medeiros.



Por alturas da procura do texto crítico que acompanharia, no folheto sobre o filme, a opinião da nossa convidada, tive alguma dificuldade em encontrar algo suficientemente interessante.

O tempo mais chuvoso destes dias tristes permitiu-me algumas arrumações - às vezes muito desarrumadas…


E assim, eis-me diante de um texto de Joaquim Fidalgo (ver link) de 30 de Abril de 2003, publicado no jornal “Público” numa crónica periódica de nome “Crer Para Ver”, que decidi partilhar convosco.

Abril ainda
Daqui, deste cantinho singelo e breve, eu gostava, muito humildemente, de agradecer a Maria de Medeiros o filme que ela fez sobre o 25 de Abril, filme que há dias revi na RTP1.
Alguém devia fazer esse filme - e ela fez.

Alguém devia falar desse dia, desse tempo, com uma linguagem bonita, rigorosa mas simples, de barulhos e festa, mas também de silêncios, de ouvir e de ver (de "ouver", como dizia o José Duarte), de passar e andar rente ao coração sem por isso deitar fora a cabeça - e ela falou. Alguém devia contar essa história com razoável atenção à realidade dos factos - e ela contou -, mas sem ficar também preso à mera espuma da factualidade mais imediata do real - e ela não ficou. Ela temperou a história com umas quantas histórias ficcionadas, criadas, reinventadas, para assim chegar mais e melhor (e nós com ela) à verdadeira verdade daquilo que aconteceu. E nada melhor do que uma boa ficção para nos revelar a verdade tantas vezes invisível na mera observação dos factos, essa camada superficial das "coisas tal qual foram", que frequentemente tão pouco nos diz das coisas em si.

Alguém devia, por um momento, devolver-nos os nossos heróis puros, simples e ingénuos, heróis que coordenam as operações militares de um golpe de Estado com o mapa das estradas do ACP e se perdem nas ruas estreitas da cidade grande, e param ao sinal vermelho do semáforo quando vão a caminho de fazer a revolução só porque não querem magoar ninguém, mas que são ao mesmo tempo tão determinados, tão seguros, tão generosos - e ela devolveu-nos. Pôs-nos ao lado deles por um instante de sonho (tão real ele também), mesmo sabendo nós que muitos haveriam de ser, mais tarde, triturados pela roda voraz de novos e velhos poderes. Muitos, não todos. E um só que fosse, um só que sobrasse...

Alguém devia pôr a par história de Abril e história de amor, falar de uma e de outra entrelaçadas, como a metáfora tão realidade de uma Manuel e uma Rosa enfim livres por todos os lados, enfim encontrados, enfim dados no seio acolhedor de uma "chaimite" que anunciava o tempo novo - e ela, Maria de Medeiros, pôs, falou.

Como já antes, quero crer, o tinha feito Sophia de Mello Breiner Andresen, artista única do olhar, do ver e do dizer, em dois dos seus poemas mais conhecidos, tão sintomaticamente semelhantes no impulso inicial, tão paralelos na forma, falando um de uma coisa e outro de outra e os dois, no entanto, da mesma - e de um quase mesmo modo. Poemas separados por três décadas, mas, bonita coincidência, próximos até nos números do tempo em que nasceram (um de 1947, outro de 1974), poemas que guardamos dentro de nós com o encanto do primeiro alvorecer.

Este:
"És tu a Primavera que eu esperava
A vida multiplicada e brilhante
Em que é pleno e perfeito cada instante."
(Dia do Mar, 1947)

E este outro:



"Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo."
(O Nome das Coisas, 1974).

Poemas de amor, ambos.

Joaquim Fidalgo

quinta-feira, 7 de abril de 2011

PERGUNTA: QUANTOS PARES DE OLHOS ESTIVERAM ONTEM NO CLUBE DE CINEMA?

1
Para começar, entendo que, em si mesma, a presença, na sessão, da mãe de uma aluna constituiu já um ganho e um passo importante na evolução do clube. Mais ainda se, como aconteceu, essa mãe assumia a responsabilidade da escolha de um filme. E, concretamente, esse ganho e esse passo tornam-se perfeitos quando a mãe em causa é Paula Montez, que imprimiu ao debate um interesse, uma simpatia e, portanto, uma dinâmica muito peculiares.
2
Houve outros aspectos que não quero deixar de assinalar, porque me tocaram. Por exemplo, a presença do André, com quem mantive, neste mesmo blogue, uma cortês mas acesa discussão acerca do preconceito em relação ao cinema português. Que o André fosse ver o filme de Maria de Medeiros e, mais do que isso, o tivesse apreciado, agradou-me. Não como se eu tivesse vencido algum tipo de guerra: eu e o André nunca estivemos em guerra, sempre estivemos em paz, argumentando e aprendendo em conjunto. (E digo-o sinceramente, não para manter um registo politicamente correcto, que, como sabem, não é o meu género). Perguntei-lhe: «Então, gostou?»; respondeu-me: «muito!» Bastou.
3
Finalmente, a sessão foi importante porque, sendo um filme sobre o 25 de Abril (mesmo tratando-se de um filme com erros e imperfeições), cumpria, de certa forma uma missão, um dever para com a memória, e nem por isso afugentou os jovens mais jovens. Tivémos a casa cheia de rapazes e raparigas de cujo imaginário o 25 de Abril não faz e nunca fez parte. Atentos, curiosos, com os olhos muito vivos de perguntas (das perguntas que depois, no debate, não foram capazes de formular, mas que os mais velhos iam adivinhando...)
4
Perguntava-me o Francisco, sorrindo, se eu tinha reparado bem na diversidade de idades que ali se tinham cruzado: alunos de todos os anos, uma mãe, professores com diferentes graus de vivência e memória do 25 de Abril. Se eu reparei? Ai não!
5
Gosto muito de falar de filmes. Ultimamente, como vêem (ou lêem), tem-me apetecido mais falar acerca da plateia. São fases. O ponto é: este clube anda a encher-me de orgulho e alegria - outra vez!

terça-feira, 5 de abril de 2011

24.ª Sessão do CC de 2010/2011

Quarta-feira no Anfiteatro
06 de Abril de 2011
às 14h00


Capitães de Abril

de Maria de Medeiros


apresentado pela
Encarregada de Educação

Paula Montez


Abril será sempre o mês da Revolução dos Cravos

Escolhi o filme «Capitães de Abril» por motivos de ordem pessoal e por motivos de ordem histórica.

Andava na 4.ª classe (actual 4.º ano) quando aconteceu o 25 de Abril. Sou daquelas pessoas que tem a imagem de criança de ver os quadros de Marcelo Caetano e de Américo Tomás a serem retirados da parede da sala de aula. Lá em casa na parede da sala havia um quadro do Che Guevara e recordo o receio que a minha mãe tinha que alguém de fora o visse, o homem que ia contar a luz ou alguém que fosse fazer uma reparação. O meu pai era oficial da Marinha, uma pessoa de esquerda que não concordava com a ditadura. O meu irmão com quase 18 anos estava na calha para ir para a Guerra Colonial. O 25 de Abril entrou em minha casa como uma esperança renovada. No primeiro 1º de Maio (dia do Trabalhador que antes não se podia comemorar) fomos para a Alameda e, daquela imagem do povo unido enchendo as ruas ainda sem bandeiras de partidos políticos, retenho a ideia de que as pessoas estavam realmente com uma expressão feliz nos rostos. Tinha chegado o seu momento de sentir a Liberdade de poderem falar umas com as outras sem o receio de serem denunciadas à polícia política (PIDE) pelo vizinho do lado.

Passaram já mais de três décadas do 25 de Abril e muito dos que aqui estão a assistir ao filme são filhos da geração dos filhos de Abril. Habituámo-nos a comemorar a revolução cada vez mais longínqua de Abril, mas muitos de nós já não sabemos exactamente o que comemoramos. Para as próximas gerações o 25 de Abril será apenas mais um acontecimento a estudar no livro de História. Para além disso restam-nos as imagens: as fotografias e os filmes documentais que ficaram, e os filmes que entretanto se fizeram.

A Maria de Medeiros, actriz e realizadora do filme «Capitães de Abril», é também ela uma filha de Abril que achou pertinente traduzir o 25 de Abril num filme. Para isso teve certamente que estudar a época e que se documentar, porque este não é meramente um filme ficcional, é um filme que retrata um momento histórico. No entanto não se pode considerar um documentário porque as cenas são recriadas, com histórias por vezes mesmo romanceadas. A meu ver, com a minha memória dos factos e os conhecimentos que tenho do 25 de Abril, a realizadora soube captar o momento e dar uma ideia muito fiel do que realmente aconteceu naquele dia.

Estamos no mês de Abril. Para as pessoas da minha geração, o mês de Abril será sempre o mês da Revolução dos Cravos. Naquele dia foi possível acabar com a ditadura sem se recorrer à violência. O povo saiu à rua e os soldados colocaram-se do lado do povo, contra um regime que os mandava para a guerra morrer ou matar. Por isso foi um momento completamente bonito, com as ruas cheias de gente unida a acreditar em si própria e na sua capacidade de impor uma mudança.
Desejo que apreciem o filme e que participem activamente no debate.
E boas férias que bem merecem!

Paula Montez



domingo, 3 de abril de 2011

A Amizade no Clube de Cinema

Nas sessões dos “Gostos Discutem-se” existem pelo menos 4 formas de agir quando um membro do Clube de Cinema decide fazer uma escolha, com a qual não se concorda, e apresentar um filme.

1 - Uma é ir à sessão mas ignorar.
Não o questionando portanto. Por ausência de argumentos ou porque tendo-os se respeita o autor da opinião e se deseja que o debate não provoque feridas que podem deixar marcas no futuro relacionamento.

2 - Outra é não estar presente na sessão.
Surge também para evitar o confronto. Pode-se sempre arranjar um falso motivo para a ausência. Em alguns casos até se pode escrever no blogue, sobre outro assunto, com indirectas à qualidade do filme ou do realizador, mas sem assumir a discordância duma forma clara.

3 - Outra ainda é não ir à sessão e explicar porquê.
Dando a explicação a terceiros ou acabando por desenvolver os seus argumentos no blogue. Sem o fazer verbalmente, no local indicado que é no debate que se segue à passagem do filme. Afinal todos têm o direito a escolher pelo menos um filme e poder ter o prazer de o debater, mesmo que existam opiniões desfavoráveis. Se todos utilizassem esta estratégia nunca haveria um debate suficientemente rico e possivelmente existiria uma unanimidade bem desinteressante.

4 - Outras vezes decide-se ir à sessão e enfrentar o confronto de ideias.
Sem preconceitos. De uma forma civilizada. Sem golpes baixos, truques de argumentação ou outros estratagemas conhecidos que não conduzem a um salutar debate. Aquilo que eu chamo de “debate honesto”. Sem vencidos nem vencedores. Tentando não transformar a conversa num jogo: em que vencer é mais importante do que ouvir o que o outro tem para nos dizer. Desta forma eu fico a pensar nos argumentos que me foram colocados e espero que o outro faça o mesmo.

Reconheço que no Clube de Cinema, face a escolhas ou opiniões de alunos, professores ou convidados, já utilizei a primeira opção embora muito poucas vezes. Sempre que o fiz fiquei com o sabor amargo de sentir que não consegui ser suficientemente corajoso para enfrentar o meu companheiro de Clube com a minha opinião e poder voltar a conversar sem ressentimentos. Principalmente quando se trata de um elemento mais antigo, que eu já considero Amigo, não me deixa inteiramente satisfeito. Sinto um sentimento de cobardia que não me deixa bem comigo próprio. E por isso tenho vindo a utilizar a última opção. Provavelmente, em alguns casos, posso vir a perder algumas Amizades. Mas sinto um sentimento de coerência que me faz dormir descansado.

Nestes quase 3 anos de vida do Clube de Cinema já fiz várias Amizades com alunos, professores e convidados. Já assisti a sessões de filmes com que, à partida, não simpatizava muito e depois mudei de opinião. Noutros filmes em que eu depositava grandes esperanças, percebi que perderam a frescura que eu julgava que tinham. E claro, felizmente, a maioria dos filmes mantiveram ou até melhoraram aquando duma outra visão. Para isso foi sempre essencial o debate que se realizou no final e que faz deste Nosso Clube algo tão especial. Só apresentei ainda 2 filmes e acho que faltei somente a uma das 70 sessões organizadas desde Novembro de 2008, porque tive que dar assistência ao meu filho mais novo que se encontrava doente. E bem me custou porque o filme era “O Leopardo”, apresentado pelo meu Amigo José Pacheco.

Relembro que este texto não se refere aos membros do Clube, alunos e professores, que (simpatizando ou não com a proposta de filme) têm justificações incontornáveis para as suas ausências: preparação para os testes e o estudo em geral, reuniões, preparações de aulas ou, simplesmente, compromissos pessoais inadiáveis
.

É claro que este post se dirige a todos os meus Amigos do Clube de Cinema que, por um motivo ou outro, têm optado, por vezes, por utilizar as estratégias 1, 2 ou 3. Apesar de não concordar com eles quando agem dessa maneira, eu considero-os ainda meus Amigos.


Tem sido um prazer enorme partilhar várias opiniões e conhecer diferentes propostas de filmes nestes 3 anos e continuar a fazer Amizades. É por isso que eu continuo a ser um fiel Amigo do Nosso Clube de Cinema “Gostos Discutem-se”.