quinta-feira, 4 de março de 2010

ERIC ROHMER E PEDRO MEXIA NO CLUBE

Convidado a escolher e a propor um filme, Pedro Mexia decidiu-se por um Rohmer (e que a propósito!). "Um Conto de Verão".

Emprestou-me o DVD para que o visse primeiro, se quisesse, a sós, em casa.
Vi-o. Sozinho. À noite. E devo confessar que foi uma experiência confusa, entre o prazer que me suscitavam a beleza e a tensão do filme, das personagens, dos sentimentos, ou a ligeireza dos "jogos de sedução" (como Mexia se lhes referiu depois), e o receio de que os jovens - mesmo os do clube de cinema, com duas ou três excepções - pudessem não estar preparados para um objecto tão raro, tão exigente, tão ao arrepio dos hábitos cinematográficos de hoje.

Mais tarde, durante a exibição, confesso, o mesmo receio pateta me acompanhou durante todo o tempo. Pois não fora a Catarina a dizer-me: «Um filme francês? Detesto filmes franceses!»? Pois não fora o Afonso a dizer-me: «Francês? Ah, então não vou!»? (E não veio, o puto!). Que iam sentir, que iam pensar, que iam compreender daquilo, que iam desprezar daquilo?

Como imaginam, quando a luz foi ligada e, após as brilhantes considerações de Pedro Mexia, se iniciou a conversa, foi com a mais agradável das surpresas que dei conta das reacções dos jovens. Por causa do gosto, que mostraram, por um tempo e um ritmo cinematográficos tão singulares, por causa do seu fascínio pela perturbação daquele jovem em face do amor e da amizade, em face da rejeição e da superabundância, por causa da sua sensibilidade à beleza daqueles diálogos tão prolixos, tão densos, tão "irrealistas", no sentido - como Mexia insistiu - em «que, de facto, os jovens não falam assim».

E o próprio Mexia foi um sedutor: pela sua voz, tudo surgiu como redes de ligações possíveis e imprevisíveis, onde cabiam o teatro, a literatura, a filosofia, o cinema, a História, Portugal, França, o mundo, sem esforço nem artifício, fluindo graciosamente. Pela sua voz passou o seu imenso amor pelo cinema e, sobretudo, por Eric Rohmer.

Indo a seguir para casa, por estradas carregadas de trânsito e água, num carro muito amolgado e com as luzes de farol perigosamente fundidas, não conseguia sair daquele momento - meia hora antes, no anfiteatro, com Rohmer, Mexia, e muita gente, entra a qual jovens cultos, inteligentes, interessados, interessantes.

3 comentários:

  1. Quando o Pedro Mexia disse que este realizador tem aquela particularidade "ou se gosta bastante ou nao se gosta de todo", eu fiquei a perceber tudo. Sou daqueles que nao gosta mesmo. Nao tenho muita paciencia ainda. Admito que deve ser um bom filme dentro do genero, mas nao, obrigado. No entanto, gostei bastante da dicussao depois do filme. Talvez um dia mais tarde eu veja este filme com outros olhos.

    ResponderEliminar
  2. a sessão foi muito interessante e fiquei surpreendido pelo facto de a grande maioria dos jovens ter gostado do filme (algo que eu não ia mesmo à espera). não todos, claro, mas numa sociedade que nos habitua a um cinema de acção onde qualquer estímulo intelectual é reduzido a um bum! de explosões e tiros intermináveis, tal já seria de se esperar. não posso deixar de comentar que o preconceito em relação ao francês se verifica em relação ao mudo, ao preto e branco, ao não-americano, ao "não-acção" e (agora que o 3D está na moda) verificar-se-á daqui a uma década ou duas em relação ao "não-3D". o cinema evolui mas a mentalidade das pessoas estagna como um embrião que não nasce nem morre. uma comparação não tão disparata como poderá parecer à primeira vista.

    ResponderEliminar
  3. Eric Rohmer... Ora ai está um autor que desconheço! Já ouvi o nome (associado à nouvelle vague, será?), mas ainda não vi nenhum filme dele.

    ResponderEliminar