Por mim, o debate está encerrado; expusemos as nossas posições, porventura com alguns equívocos pelo meio, e não me parece que a continuação vá trazer novidades.
Todavia, sinto necessidade de clarificar alguns pontos. Mais por causa do que alguns espectadores possam ter julgado ver, do que pelos estragos efectivos: não houve quaisquer estragos, aliás. Os dois fundadores do clube conhecem-se muito bem e a sua amizade sai reforçada das suas discordâncias.
Não quero tornar ao "Paris, Texas" em particular, mas à minha relação pessoal com um clube que se chama "Gostos Discutem-se", e que, por isso mesmo, vejo - e sempre vi - como um clube onde as pessoas praticam alegremente a discussão, comprazendo-se no gosto de argumentar e no prazer de se porem em confronto, sem melindres nem receios.
1. Para mim, o clube é um projecto colectivo. Existe enquanto interesse comum, que nos une todos, seus participantes. Nenhum dos professores que abraçam a ideia e a "praticam", todas as quartas-feiras, tem seja o que for a ganhar com essa participação. A não ser em termos de prazer, camaradagem e aprendizagem. Não singramos na carreira, não somos avaliados por este projecto, não recebemos dinheiro. Pessoalmente, não tenho qualquer redução no meu horário por causa dele. Nunca fiz questão. Quarta-feira, aliás, é um dia em que não tenho aulas: venho propositadamente à escola para "clubar".
2. Sou um amante de cinema, mas considero-me, do ponto de vista dos conhecimentos, um cinéfilo menor. Não vou para ensinar, vou para fruir e aprender; gosto desta perspectiva. E se alguma vez me reconheci na expressão «os professores ensinam tanto os alunos, quanto aprendem com eles [e, neste caso, aprendem com os outros professores]» foi sem dúvida no clube de cinema.
3. Para mim, o debate é um jogo. Argumentar é um prazer infinito. Como nada ganho, materialmente, com o clube de cinema [vide ponto 1], quando debato não o faço movido por interesses ocultos nem por objectivos mesquinhos. Não debato para me promover nem para fragilizar a posição dos outros. Faço-o unicamente pelo gosto da discussão.
4. Discuto as ideias, não as pessoas. Quando, no contexto, me sucede associar uma ideia à pessoa que a defendeu, não tenho a intenção de me comparar, nem se trata de "fulanizar" a discussão. Faço-o porque entendo que debater significa, numa forma muito positiva e nada agressiva, entrar em combate. Do meu ponto de vista, "debater" não é expor as ideias, nem pô-las lado a lado, nem trocá-las. Não é limitarmo-nos todos a "expressar" as nossa impressões. É jogarmos.
5. Mas o facto de ser um jogo não significa que o resultado tenha de ser a vitória de um ou de outro. Não preciso de "vencer": agrada-me o puro exercício desse combate; agrada-me discordar. Preciso de ter razões para discordar [não discordo por discordar nem por sentir necessidade de o fazer], mas, confesso, agrada-me discordar. Acontece-me discordar do Francisco, porque felizmente não somos clones, embora raramente discorde dele no essencial; acontece-me discordar da Teresa e da sua visão feminina, quando se desvia da minha visão masculina; acontece-me discordar do João Leão. Ou da Ana. Ou do Rodrigo. Ou da Luísa [Simão] e mesmo da Luísa [Fragoso]. Mas encanta-me que discordem de mim. Aliás, mesmo nas aulas, a discordância dos alunos é quase sempre um estímulo (pelo menos quando é uma discordância com rigor e bem fundamentada). Talvez o segredo resida aqui: a discordância estimula-me. Nomear uma pessoa, dizer: «Não concordo com a posição do Rodrigo, porque ele diz isto, e eu acho aquilo», é, sobretudo, chamá-la para a luta.
6. Não tenho, da discussão, a ideia iluminista e iluminada de que se trata de fazer luz, ou levar a que a "razão" venha ao de cima. Não ando a tentar perceber quem está certo: trata-se de testar e pôr em confronto diferentes chaves de leitura e diferentes gostos.
Evidentemente, não espero que todos tenham, da discussão, o mesmo entendimento que eu. Apresento esta série de pontos simplesmente para evitar equívocos. Para que se não comece a pensar que uma discussão acesa representou alguma zanga. Para que se saiba que, quando discuto, é só disto que se trata. Mais nada.
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