segunda-feira, 18 de maio de 2009

A MINHA HOMENAGEM AO QUARTETO

Na altura, os cinemas que havia em Lisboa correspondiam ao conceito de grande sala de espectáculos, com uma plateia extensa, balcão, camarotes, e um senhor de uniforme que nos conduzia pelos corredores atapetados até aos respectivos lugares. Sim, meus amigos, sou tão velho quanto isso!

O Quarteto, de que já aqui falei, inaugurava um novo estilo: quatro salas, como o nome indica, obviamente pequenas, mas que permitiam uma multiplicação de filmes variadíssimos pelo espaço e pelo tempo.

Mais importante, o Quarteto podia dar-se ao luxo de introduzir um cinema alternativo: como havia sempre, em alguma das salas, um filme comercial, que assegurava público, tornava-se possível, por outro lado, dar espaço a um Godard, a um Tarkovsky, a um Fellini...

Talvez que, sem que o pudéssemos prever, o Quarteto fosse, em Portugal, o início do espartilhamento do cinema, «à americana», em dezenas de minúsculas salas concentrados no terraço de algum centro comercial, com bilheteiras-bar que, para economizar, tanto vendem bilhetes como as horrendas pipocas ou os ruidosos refrigerantes...
Mas, vá lá, tentem imaginar o bem que aquilo proporcionava a um jovem universitário como eu: estudava, à época, na Universidade de Lisboa, muito próxima dali: todo o tempo que me sobrava, e era bastante, podia ser dedicado a um proveitoso passeio entre as quatro salas.

Se não conseguia ir a uma certa hora, ia a uma outra; nenhum horário me constragia demasiado rigidamente; aproveitava o tempo - e o dinheiro - do almoço para mergulhar antes num filme. Havia sempre algo para descobrir, qualquer que fosse a companhia ou o estado de espírito.

Johnny Darko papou, no outro dia, dois filmes? Eis, talvez, a observação que me trouxe o desejo de homenagear aqui o velho Quarteto: isso de ver dois, às vezes três ou quatro filmes seguidos numa tarde era o que eu fazia sempre, numa mudança vertiginosa de sala, de realizador, de registo...

Ali combinávamos encontros, entre porcarias imediatamente esquecíveis ou obras-primas que me marcaram para sempre. Ali tínhamos debates profundamente aguerridos, entre ciclos, festivais, apresentações que nunca faltavam.

Recordar o Quarteto é, no fundo, recordar o que foi, durante esse tempo, mais minha casa do que a minha própria casa.

1 comentário:

  1. Faz falta este culto do Cinema hoje em dia, estas salas grandiosas sem pipocas e refrigerantes.
    Também gostava de ter uma segunda casa assim, que inveja!

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