Vamos analisar o filme, em primeiro lugar. Já se disse aqui muito mal dele, mas falta justificar cientificamente. E o Cinema é uma ciência. A Arte é a Ciência das emoções. E não me venham com a lengalenga já pisada e repisada do: "Gostos discutem-se!" Claro que é verdade! Mas não podemos usar essa frase como justificativo para não reflectirmos sobre os nossos dogmas pessoais. Se assim fosse, de que serviriam os críticos de cinema e de arte em geral? Essa frase, que simboliza a individualidade democrática do nosso século, pode ser também muito perigosa. Se fulano X se dirigir ao pé da Escola de Atenas, de Rafael, ou à Madona dos Rochedos, de DaVinci, e disser: "Isto não vale nada!", então a nossa democracia corre o risco de se tornar o regime da ignorância e da anulação do pensamento e do intelecto. (Ainda no outro dia, uns amigos meus foram a Barcelona e, sob a recomendação de meu pai, visitaram o Museu Miró, considerado um dos melhores museus do mundo. Saíram de lá a dizer que aquilo tinha sido a maior M***A que já tinham visto, perdoe-se-me a expressão vulgar.) Continuando, vamos lá a analisar a Odisseia no Espaço:
1º - Interpretação - Nula. O papel principal é o de um supercomputador (cujo botão vermelho é filmado durante metade do filme). A verdade é que nem consegui fixar bem o rosto dos tripulantes, tão pouco tempo apareciam...
2º - Montagem - Perfeitamente banal.
3º - Caracterização - Fraca. Os macacos parecem homens numa gabardine. E é preciso lembrar que nesse mesmo ano surgia o filme Planet of the Apes, espectacularmente bem feito, e com um orçamento muito, muito, muito menor. Tal como o tubarão de Jaws, aquele episódio só dá vontade é de rir.
4º - Efeitos Especiais - Não estão maus, mas é bastante simples filmar naves no espaço.
5º - Argumento - Terrível... Pretensioso... Ilógico... O monólito só serve para uma deambulação filosófica sobre o conhecimento que não leva a lado nenhum. Embora se tenha dito no clube de cinema que a mensagem era muito profunda, ninguém foi capaz de explicá-la claramente...
6º - Diálogos - Macacos a berrar...
7º - Fotografia - O ponto forte do filme. As cores são belas e o tratamento visual é muito cuidado. Mas não há nenhuma cena que se possa dizer que seja verdadeiramente fantástica.
8º - Direcção Artística e Cenários - A este respeito foi feito um bom trabalho e o design do interior das naves, por exemplo, está muito bem conseguido. Mas, se compararmos com o já referido Planet of the Apes, não é lá muito original.
9º - Realização - Os planos longos e aborrecidos, cheios de suposto conhecimento, servem apenas para propiciar uma boa soneca. Kubrick mostra, mais uma vez, não ter noção do que é economia narrativa (precisava de ver uns filmes do mestre Walsh), aliás, duvido que ele soubesse o que era narrativa (que neste filme, pura e simplesmente, não existe). E o que é certo é que, embora não esquecido, o Franklin Schaffner é muito menos conhecido pelas massas do que o Kubrick!
Chegamos à conclusão de que este é um filme que teve apenas a sorte de ter meia dúzia de cenas bem fotografadas e de ter sido produzido durante quatro anos com mais de dez milhões de dollars (o Citizen Kane foi feito com 600 mil).
UM DRAMA ÉPICO DE AVENTURA E EXPLORAÇÃO (aventura e exploração? estamos a falar do mesmo filme?)
CINEMA: O PODER DO CÃO
Há 2 anos
Eça tenciono comentar com mais calma este teu texto. Como estou a fazer uma maratona de correcção de testes o comentário ficará para mais tarde.
ResponderEliminarEntretanto esta tua última observação sobre o cartaz é aquilo que eu chamo "golpe baixo"... (e tu és perito nisso). Sabes perfeitamente que as distribuidoras dos filmes se encarregam de acrescentar os mais variados "slogans" de aliciamento que por vezes nada têm a ver com o filme e que saem da órbita da responsabilidade do realizador. Se eu me desse ao trabalho procuraria também vários exemplos de cartazes dos vários filmes que tu gostas bastante (alguns deles eu também) e que não correspondem minimamente à ideia original do realizador. Por isso argumenta limpo porque também o sabes fazer muito bem…
E não venhas dizer que “foi a brincar” porque o efeito que quiseste provocar ficou…
Eu também gosto de brincar mas então assumimos à partida que o estamos sempre a fazer.
Abrindo aqui para uma discussão amigável: não posso concordar que o cinema seja a «ciência das emoções», como se fosse possível fazer-se uma demonstração cartesiana da qualidade (ou sua ausência) de um determinado filme; penso, pelo contrário, que se trata da expressão artística das emoções, e que isso faz toda a diferença: sobra sempre um campo, que se não pode anular - e é até decisivo - para a ambiguidade das interpretações. Da mesma maneira que o pintor não é um cientista ou o poeta o não é (não negligenciando o que haja de científico nos conhecimentos que devem possuir para «criar» a sua pintura ou o seu poema). A questão é que, se na leitura de um poema, eliminássemos o factor «gosto» para nos atermos unicamente à sua correcção estilística, métrica e gramatical - a ciência - obteríamos bem pouco. Mas é-me evidente que os gostos se discutem... até certo ponto! (Claro que fundamentar esta posição me exigiria outro espaço. Mais tarde...)
ResponderEliminarFaltou-me dizer uma coisa muito importante sobre a Odisseia no Espaço, e que ainda ninguém mencionou. E é o seguinte: não só os planos são quase intermináveis e enfadonhos (porque o Manoel de Oliveira também filma em longos planos, mas sem ser enfadonho), como o Kubrick, como se estivesse a fazer de propósito, quase sempre que termina uma cena, ele deixa o ecrã quatro ou cinco segundos completamente preto e com a ausência de qualquer som. O que isso gera é ainda mais sono e aborrecimento... É o mesmo que o Jim Jarmusch faz no Dead Man e que também prejudica um bocado o filme.
ResponderEliminarQuando tivesse tempo comentaria este teu post Eça, mas iria muito de encontro ao que o professor José disse, pelo que neste assunto fico por aqui. Quanto ao filme, esperem até dia 23 de junho que eu deixo aqui um testamento.
ResponderEliminarAh, e espero que já tenhas percebido que quando utilizei a palavra "profundo" no discurso que fiz sobre o filme, não era relativo ao argumento mas sim ao filme em si: O filme não é só um "filme de ficção cientifica" é bem mais que isso. Logo o meu "profundo", talvez mal aplicado devido ao alienamento em que ainda me encontrava, era em relação ao tipo de obra que tinhamos acabado de ver e não às interpretações que se podem tirar, que são algumas ou nenhumas. É tudo muito subjectivo.